sexta-feira, novembro 11, 2005

Tapar o sol com uma peneira, ou como resolver um problema de hoje vigarizando os nossos descendentes

Notícia no Publico que se transcreve:


Quatro mil milhões garantem reformas de 27.500 trabalhadores
Segurança Social pode absorver fundo de pensões do Millennium BCP
10.11.2005 - 07h42 Cristina FerreiraPÚBLICO


O Millennium BCP propôs ao Governo a passagem da totalidade dos trabalhadores do banco para o regime geral da Segurança Social o que, a concretizar-se, implicará a transferência para a Segurança Social do fundo de pensões dos seus empregados, avaliado em quatro mil milhões de euros, o equivalente a 2,9 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2005.

Neste cenário, as contas da Segurança Social fariam um encaixe de igual montante, tal como como sucedeu com a Caixa Geral de Aposentações, entidade que faz parte do subsector Estado, aquando da transferência do fundo de pensões dos trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos (CGD).
Se o Eurostat, o organismo de estatística da União Europeia que também certifica as contas públicas dos Estados-membros, aceitasse a operação, os 4000 milhões de euros do fundo de pensões do BCP seriam contabilizados como receita extraordinária da Segurança Social do ano em que se realizasse a transferência, reduzindo o défice das administrações públicas em igual montante. Por exemplo, se a operação fosse concretizada em 2005, o défice deste ano em percentagem do PIB seria de 3,3 por cento, em vez dos 6,2 por cento previstos.

O PÚBLICO sabe que o ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Vieira da Silva, e o presidente do Millennium bcp, Paulo Teixeira Pinto, estiveram já reunidos duas vezes nos últimos meses para debater a questão da integração dos trabalhadores do banco no regime geral da Segurança Social, mas as duas partes recusam comentar.

"O ministro por agora nada tem a dizer sobre o assunto", afirmou ao PÚBLICO o porta-voz do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, recusando pronunciar-se igualmente sobre as consequências orçamentais da operação. "O banco não tem declarações a fazer", declarou por seu turno o porta-voz da instituição.

Na eventualidade do fundo de pensões do BCP ser integrado no sistema público, isso afectaria os cerca de 15.000 reformados do grupo mais os 12.400 trabalhadores no activo admitidos antes de Março deste ano - os contratados posteriormente entraram directamente para o regime oficial.

O que muda para os trabalhadores

Para os actuais reformados do grupo, a única diferença é que passariam a receber as reformas da SS. Quanto aos trabalhadores no activo, descontam cinco por cento do ordenado para o fundo de pensões do banco e três por cento para a Caixa de Abono das Famílias dos Empregados Bancários (CAFEB), o que perfaz oito por cento do salário. Com a integração no sistema geral, os descontos passariam a ser canalizados para o regime público de pensões. Como as deduções para a SS a cargo dos trabalhadores são à taxa de 11 por cento, os funcionários do banco poderiam ser prejudicados. Para evitar que isso aconteça, o Millennium avançaria com o diferencial de três por cento, integrando-o no salário dos colaboradores - algo que já acontece com os funcionários admitidos no BCP depois de Março, que beneficiam de uma cláusula que os impede de auferir um salário líquido inferior ao que recebem os abrangidos pelo regime tradicional dos bancários. Além de cobrir aquela diferença, o Millennium pagaria as contribuições para a SS a cargo do patronato, no caso 23 por cento da remuneração.

Caso se concretize a proposta de Teixeira Pinto, a responsabilidade do pagamento das pensões dos aposentados e actuais trabalhadores do BCP passará para o Estado, e o banco verá eliminados os riscos associados ao actual sistema de reformas dos bancários (mercados, metodologia e pressupostos actuariais, longevidade e crescimento dos salários).

Da responsabilidade da instituição ficaria apenas o pagamento dos complementos salariais negociados com o funcionário (como seja o suplemento de isenção de horário), o que seria assegurado pelo fundo de pensões complementar com uma dotação de 500 milhões de euros.

A integração dos bancários no regime público tem sido uma medida reclamada pelos banqueiros portugueses, que alegam que a sustentabilidade do sistema de pensões dos seus trabalhadores está em causa, pois os reformados do sector ultrapassam já os activos totais e as metodologia e pressupostos actuariais estão desajustados. Este é um tema de âmbito do ACTV (contrato colectivo de trabalho) e que não necessita de autorização legislativa, mas do acordo das várias partes envolvidas.