terça-feira, agosto 08, 2006

Duas ou três coisas sobre os incêndios

1. A causa primeira dos incêndios que lavram descontroladamente no Verão reside na alteração do modo de vida das populações que há quarenta anos viviam da agricultura e agora vivem nas cidades ou na sua periferia. Não há mais camas para o gado logo não há limpeza das matas, não há quem veja o incêndio quando começa, porque o chamado "interior" do país (tal como o resto do continente Europeu) está deserto de pessoas. Quando se dá pelos incêndios já estes atingiram proporções gigantescas.

2. Os media deliram com incêndios: dá imagens emotivas com o sensacionalismo de uma guerra, e com muito pouco custo e nenhum risco.

3. Estão assim criadas condições para que os sucessivos governos, cada vez mais protectores e intervencionistas, prometam soluções que só se podem cumprir instituindo sistemas totalitários de controle. Do género de nós-é-que-iremos-acabar-com-isto. Com o isto começa a funcionar um "sistema". O sistema daqueles que vivem em simbiose com os incêndios: políticos, bombeiros, doentes mentais incendiários, madeireiros, fornecedores de equipamento, eventualmente jornalistas, todos a fazerem dos incêndios um negócio.

4. Quando se verifica que os governos não cumprem, ( e nenhum cumpre porque simplesmente a promessa não é "cumprível"), os media ajudam a lançar a "culpa" sobre os políticos. Sobre todos os políticos. Os políticos assumem a culpa, e iniciam um novo ciclo vicioso, com mais promessas, que por sua vez não são cumpridas, os media falam, etc.etc.

É possível "acabar" com os incêndios?

Penso que não, mas que é possível acabar com o negócio dos incêndios, e com as consequências perversas do sistema. A tecnologia de vigilância precoce por satélite não é nada do além, e uma vez implementada no terreno e conjugada com forças de intervenção rápida (e não o telefone dos bombeiros da terra), poderá eliminar diversos níveis de "poder" que, enquanto actuam, vêem, discutem, reúnem, falam no telemóvel, fazem as frentes de incêndio atingir vários quilómetros.

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Há três anos atrás, um pequeno incêndio deflagrou perto da minha casa na Serra da Arrábida. Telefonei para os bombeiros locais que já estavam avisados. Num cabeço, onde observei o andamento do incêndio, falei com o chefe dos bombeiros que entretanto chegara num jipe Toyota branco, novo, todo pimpão. Nem trazia binóculos, e tive de lhe emprestar os meus. Saiu dali dizendo-me para telefonar para um número de telefone e pedir para falar com ele se eu visse o incêndio mudar de direcção e vir para cima das nossas casas. Telefonei, e fui atendido por um senhor que me disse ignorar o nome do senhor chefe, porque eu estava a falar com uma central que atendia todo o país. Entretanto o incêndio tomou as proporções que são conhecidas e ardeu metade da serra. Só parou quando entraram em acção os aviões.

Dois meses depois, comentando o incêndio com um morador do Portinho da Arrábida, e dizendo-lhe da sorte que tinha por o incêndio ter parado um pouco antes, este respondeu-me:
"- O que nos valeu foi que o guarda do Convento telefonou para o Dr. Carlos Monjardino (proprietário do Convento da Arrábida), e avisou-o que o Convento ia arder. Passada meia hora estavam cá dois aviões a acabar com o fogo."

Verídico.

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