sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Homenagem a Joana Gomes

Raras vezes fui tão afectado pela notícia de uma morte súbita, como com o anúncio da embolia pulmonar que no passado domingo nos levou a Joana Gomes, a Semiramis, cujos escritos me habituei a saborear diariamente desde há cerca de dois anos.

A morte no ciber-espaço pode ser tão brutal e tão sentida como a morte da vida real, pela intimidade do contacto que estabelecemos, que apesar de ser num só sentido, não é seguramente menos forte do que o contacto humano. Apesar de a não conhecer pessoalmente, e ter apenas com ela uma curta correspondência por email, devido a um artigo de Vaclav Klaus que eu traduzi e ela publicou, eu tinha a Joana como uma amiga, ainda que virtual, dotada de um bom senso, clareza, e independencia de espírito fora do comum, com um invulgar conhecimento da cultura clássica e uma sólida base de conhecimentos de economia, grande defensora da liberdade, sem adjectivos.

A Joana era independente. TOTALMENTE independente. FEROZMENTE independente. Julgo que a sua independência era devida não só à sua maneira de ser, como substancialmente, ao anonimato que a protegia.

Contráriamente à opinião de José Pacheco Pereira, na sua diatribe contra os bloggers anónimos, muito defendida pelos fazedores oficiais de opinião, e outros veículadores de ideias em segunda mão, penso que é apenas pelo facto de um blogue ser anónimo, ou quase anónimo, o que vem dar na mesma coisa, que pudemos aceitar as opiniões expressas como genuínas e não como recados de qualquer corporação, instituição, ou apenas expressão do politicamente correcto.

Era exactamente isto que nos agradava, a nós os leitores do blogue da Joana.

Na sua curta viagem a Joana teve um papel importante. Influenciou muito a muitos. Espero que os seus herdeiros tenham o cuidado de guardar os seus escritos, e eventualmente publicar um livro. Até lá recebam um abraço de muito sentida homenagem.