quinta-feira, março 01, 2007

À volta da Evolução

Quando Charles Darwin embarcou em 1831 com a magnífica idade de 21 anos, na celebríssima viagem do Beagle que o levou durante cinco anos a dar uma volta ao mundo, foi levado a concluir pelas observações geológicas e morfológicas do território que visitou no interior da cordilheira dos Andes, que a Terra era certamente muito mais antiga, muitos milhões de anos mais antiga, do que a teoria corrente baseada nas descrições da Bíblia, então proclamava.

Foi esse talvez o primeiro passo que o levou a entender como é o tempo o principal motor da acção da evolução sobre as espécies, e, duas décadas mais tarde, a escrever a Origem das Espécies, onde descreve a Teoria da Evolução pela Selecção Natural, o livro definitivo, (se há algo que na ciência se possa chamar de definitivo), sobre a origem da vida e da razão porque aqui estamos.

A Teoria da Evolução pela Selecção Natural (é sempre importante relembrar o nome completo da teoria), postula o seguinte:

Porque cada individuo de qualquer espécie é ligeiramente diferente de todos os outros, fruto da diferença genética existente em cada individuo, existem necessariamente alguns indivíduos mais aptos para sobreviver na luta quotidiana pela procura de alimento e por esse motivo mais capazes de procriar do que outros, num determinado meio ambiente. Chama-se a isso de selecção natural.

Como o meio ambiente muda constantemente e alguns indivíduos se adaptam melhor que outros, procriam mais, sendo as adaptações cumulativas na sua progenitura fruto da herança genética. Chama-se a isso de evolução.

Com o passar das gerações sobrevivem os indivíduos mais bem adaptados, que vão constantemente mudando de acordo com o seu entorno ambiental. Passam-se milhares ou milhões de gerações. Dá- se a especiação, pela qual se distinguem as espécies, cada uma ocupando um nicho especial. Chama-se a isso de evolução pela selecção natural.

Até há poucos anos pensava-se que se notavam os efeitos da especiação apenas ao longo de milhares senão milhões de anos. Num livro recentemente traduzido para português, O Bico do Tentilhão, (ed. Caminho, Lisboa 2006, 460 páginas), o jescritor Jonathan Weiner conta-nos a história do casal Rosemary e Peter Grant que na ilha de Daphne nas Galapagos observou durante dez anos as modificações sofridas no sistema alimentar e no próprio tamanho e forma do bico dos tentilhões das Galápagos, do género Geospiza, provocadas por extensas secas que então se verificaram. Observaram aquilo a que chamaram de evolução ao vivo num período de tempo ínfimo na escala geológica.

Cada espécie vai evoluindo de uma forma divergente conforme se vai adaptando ao meio ambiente. (Também existe por vezes evolução convergente ou ainda evolução paralela, cuja definição deixo para mais tarde). Contrariamente ao que é muito propalado nos meios não científicos, a Teoria de Darwin da Evolução pela Selecção Natural não resulta de especulação filosófica ou outra. Resulta da observação de factos concretos comprovados cientificamente e de predições que se realizam. Darwin sempre disse que a sua teoria cairia por terra se se descobrisse um fóssil humano do tempo dos dinossauros.

Uma vez confrontado com uma orquídea que lhe ofereceram proveniente de Madagáscar, ilha que infelizmente Darwin não visitou na sua volta ao mundo, tendo curiosamente visitado a ilha de Reunião, muito perto, Darwin escreveu o seguinte texto:

"A Angraecum sesquipedale, da qual as suas seis flores irradiam como estrelas de cera cor de neve, que tem excitado a admiração dos viajantes por Madagáscar, não deve ser descurada. Um longo depósito de néctar de cor verde com a forma de chicote e com um comprimento extraordinário, está pendurado a seguir ao labelo. Em muitas das flores que me foram enviadas pelo Sr. Bateman encontrei nectarinos com mais de onze e meia polegadas de comprimento, apesar de só a primeira polegada e meia estar cheia de néctar. Perguntar-se-há para que serve um tão longo nectarino de tamanho tão desproporcionado. Penso que veremos que a fertilização da planta depende deste comprimento, e de o néctar estar apenas contido na sua parte estreita e inferior. É todavia surpreendente que qualquer insecto possa ser capaz de alcançar o néctar. As nossas borboletas inglesas conseguem ter a probóscide tão comprida quanto o seu corpo. Mas em Madagáscar deve haver borboletas com a probóscide entre dez e onze polegadas de comprimento! Esta crença que eu tenho, tem sido ridicularizada por alguns entomologistas, mas soubemos agora por Fritz Muller que há uma traça no sul do Brasil, com uma probóscide quase do mesmo comprimento."

No ano seguinte uma traça com uma probóscide de 30 centímetros (doze polegadas), foi descoberta em Madagáscar! Puseram-lhe o nome de Xanthopan morgani praedicta em honra da predição de Darwin.

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