quinta-feira, dezembro 01, 2005

A Revolução de 1640 revisitada

Comemoram-se hoja 365 anos sobre o início da Revolução de 1640, com a consequência da restauração da independência de Portugal, após sessenta anos de domínio dos Felipes.

Li hoje, com pouca surpresa aliás, que a Revolução de 1640 foi uma revolução do povo contra o domínio de Castela.

É mentira.

O envolvimento das "massas populares" na génese dos movimentos revolucionários é uma fabulação marxista que não tem nada a ver com a verdade histórica, e tem tudo a ver com a ideologia.

A Revolução de 1640 foi feita pela nobreza e parte do clero, discontentes com o modo como Felipe IV, instigado pela acção ditatorial do conde duque de Olivares, pretendia subordinar os Reinos de Portugal e da Catalunha à autoridade centralizadora de Castela. Os mesmos nobres a o mesmo clero, que sessenta anos antes tinham entregue o poder a Felipe II, depois das vicicitudes provocadas pela aventura do adolescente-idiota Dom Sebastião em Alcacer Quibir.

A nobreza portuguesa estava descontente pelas desconsiderações que sofria, e pela falta de cumprimento por parte da coroa espanhola de promessas de benesses e posições de influência na corte de Madrid; aconteceu o mesmo, exactamente na mesma altura e pelos mesmos motivos com a Catalunha.

Por volta de 1625 foi anunciada por Olivares a pretensão de angariar soldados num exército permanente. Segundo o plano chamado de Union de Armas cabiam a Portugal e à Catalunha garantir 16.000 homens cada, num total de 128.000 homens para toda a Espanha, com a finalidade de defender o Reino e as possessões portuguesas no ultramar, que começaram imediatamente após a perda da independência a serem cobiçadas pelos holandeses, com a criação da Companhia das Índias Ocidentais em 1621. Os portugueses, que não gostavam de ter soldados espanhois dentro das suas fronteiras, gostaram ainda menos de ter de partilhar o esforço de manutenção do império.

A partir de 1630 começaram a ser lançados novos impostos por toda a Espanha, que, como sempre, foram mal recebidos pelas populações. Olivares pensava mesmo que Portugal era um reino previlegiado o que tocava a impostos, por em proporção com a população que tinha, pagar menos para os cofres do estado central que todos os outros reinos que compunham a Espanha.

Estes impostos suscitaram algumas revoltas localizadas em muitas cidades e vilas de Portugal. Mas os impostos, foram especialmente mal recebidos na Catalunha, tendo provocado uma revolta generalizada que levou à intervenção armada das forças de Castela, que impotentes, tiveram de escolher entre Portugal e a Catalunha. A revolta na Catalunha foi esmagada. Em Portugal graças à acção do oitavo Duque de Bragança, Dom João, que reuniu à sua volta a nobreza insatisfeita, essa revolta teve sucesso.

Há vários mitos à volta da Revolução de 1640. Mitos sebastianistas, mitos patrióticos inventados pelo Estado Novo, e os mais recentes mitos marxistas sobre a acção popular. Para saber um pouco mais, e com a autoridade de uma fonte independente, recomendo a leitura do excelente livro Catalunya i Portugal - El 1640, pela historiadora catalã Maria Àngels Pérez Samper(ed. Curial, Barcelona, 1992, 465 páginas). Está escrito em catalão e não foi traduzido para português, mas após as primeiras páginas, mais difíceis, a lingua torna-se acessível para a maioria dos leitores de português.